Politica/Ilhéus:Quando a cota vira farsa
Diante dos últimos acontecimentos, envolvendo o mandato do vereador Márcio Bodão (Avante) por suposta fraude à cota de gênero, Ilhéus volta a acender uma luz incômoda sobre um problema que não é apenas local, é estrutural. A decisão é de primeira instância e ainda cabe recurso, com efeito suspensivo da decisão de primeiro grau. Essa realidade é um sinal de alerta que ja está aceso. A lei que exige um percentual mínimo de candidaturas femininas nasceu para abrir portas e corrigir um déficit histórico de representação, mas o que se vê muitas vezes é a lei reduzida a um número em planilha, um requisito para que a chapa se registre e o partido tenha acesso a recursos, enquanto a representatividade de fato permanece vazia. Em casos recentes, investigações e provas trouxeram à tona áudios e mensagens que deixam claro o mecanismo: candidaturas registradas sem intenção real de disputar, sem campanha, sem prestação de contas consistente, e mulheres colocadas nas listas sem a devida informação e sem apoio, muitas vezes em situação de necessidade, pressionadas ou coagidas a aceitar um “acordo” que só serve aos interesses partidários.
Não se deve, de forma alguma, colocar sobre os ombros dessas mulheres a responsabilidade pelo esquema; muitas são empurradas, coagidas, não recebem explicações adequadas sobre a candidatura e tampouco têm acesso à estrutura, recursos ou formação política. Culpar as mulheres seria inverter a lógica do problema, seria fechar os olhos para a responsabilidade central, que é do partido e de seus dirigentes, que optam pela não articulação correta, não envolvimento das candidatas no processos , não incluem nos processos políticos partidários em vez de investir na construção e promoção de lideranças femininas reais fazem o contrário infelizmente.
Em Ilhéus, é preciso lembrar que, além de Bodão, outros processos chegaram a apontar irregularidades semelhantes, e houve situações em que mandatos foram momentaneamente perdidos e em seguida revertidos por liminares, com os vereadores retornando ao exercício do cargo enquanto tramita a disputa judicial. Isso mostra a complexidade do problema, a dificuldade de reversão imediata e também a necessidade de maior fiscalização e de coragem institucional para punir irregularidades sem achar atalhos jurídicos.
O ponto central não é simplesmente punir aqui ou acolá, é perguntar como uma lei concebida para ampliar vozes femininas pode ser transformada em instrumento de manipulação, como candidaturas que deveriam representar a pluralidade da cidade terminam reduzidas a artifícios para cálculo eleitoral e acesso à verba. Enquanto partidos preferirem números a formação, enquanto dirigentes continuarem a tratar candidatas como peças descartáveis, a cota continuará sendo um expediente fragilizado, incapaz de cumprir seu objetivo transformador.
E o que acontece em Ilhéus se repete em todas as esferas políticas. O contraste entre o que somos e quem nos representa é gritante. Vivemos em um país onde a maioria da população é formada por mulheres pretas e pardas, trabalhadoras, responsáveis por suas famílias, mas nas “Casas das Leis” o cenário é o oposto: predominam homens brancos, sexagenários, políticos profissionais de muitos mandatos e representantes de grupos historicamente privilegiados. Quando não são esses, surgem os novos aventureiros, que fazem da política um palco para seus próprios espetáculos, em busca de curtidas, seguidores e engajamento, baseando-se em discursos vazios, populistas e muitas vezes mentirosos. Uns e outros, com raras exceções, seguem distantes da realidade da maioria, tratando a política como jogo de interesse e sobrevivência.
E o eleitor, como fica nessa história? Até que ponto toleramos que o nosso voto, a nossa confiança e o destino das nossas representações sejam tratados como algo negociável nos bastidores? Perguntar não é apenas criticar, é convocar: exigir transparência, cobrar responsabilidades dos partidos, apoiar candidaturas verdadeiras, não compactuar com encenações. Só assim a cota deixará de ser a fachada de um compromisso e se tornará, de fato, uma porta para mais participação, mais diversidade e mais representatividade em Ilhéus e em todo lugar. Uso esse espaço para manifestar minha solidariedade ao Vereador Márcio Bodão, que com projeto , atitudes e com o poder soberano do POVO conquistou o seu mandato com garra. E hoje se vê nessa situação que não passou pelo poder de decisão dele.
Por Professor Emenson Silva
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